As empresas estão na expectativa dos desdobramentos da votação da Medida Provisória (MP) 627, que trata de questões tributárias. É natural: a MP muda a tributação dos lucros no exterior de subsidiárias de multinacionais brasileiras, altera a apuração dos impostos federais, promove a adequação da contabilidade brasileira às normas internacionais, reabre prazos de parcelamentos de tributos federais com condições bem vantajosas, extingue o Regime Tributário de Transição (RTT) –, criado em 2007 para evitar aumento de carga tributária com a convergência das regras contábeis.
Publicada em novembro de 2013, a MP teve o prazo de vigência prorrogado e deve ser votada no Congresso Nacional até o dia 21 de abril. Já nesta semana, porém, ela pode ser analisada pela comissão mista que trata do assunto, depois que o relator, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), fizer a leitura do texto que preparou.
Empresários e Mantega
Desde a sua publicação, a norma tem tirado o sono de empresários, forçados a avaliar com cuidado os impactos das alterações em seus negócios. Ressalta, desde logo, a polêmica da tributação sobre as multinacionais brasileiras. Pelo texto original da MP, as companhias teriam cinco anos para recolher os impostos devidos sobre seus lucros auferidos fora do Brasil. O texto do relatório preparado pelo deputado Eduardo Cunha propõe um prazo de oito anos. Após reunião com grupo de empresários em Brasília, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, sinalizou que aceita a proposta, com um desembolso de 17,5% no primeiro ano e a retirada de incidência de juros nas demais parcelas. Mas, segundo o noticiário, o governo não se comprometeu com outros pontos sugeridos pelos empresários, como a reivindicação de que a parcela do lucro reinvestida nas filiais fique livre da tributação.
Marcos S. Jank, representante da BRF na reunião com Mantega, resumiu em artigo no Estadão, a razão da insatisfação das empresas. A MP traz "como conceito central o recolhimento no Brasil da diferença entre a alíquota paga no exterior e os atuais 34% vigentes no País; essa diferença será calculada pela variação patrimonial a cada exercício, independente de os lucros serem reinvestidos no exterior ou remetidos de volta como dividendos. [...]
A tarefa das empresas agora é tentar convencer o deputado Cunha a alterar seu relatório em mais um ponto, enquanto esperam o governo decidir se formula ou não uma outra medida provisória.
500 emendas
Cheia de detalhes, com dispositivos que fogem do assunto principal, a MP 627 tem uma centena de artigos e atraiu mais de 500 emendas, colocando o meio jurídico e empresarial em compasso de espera. A incidência de impostos sobre os dividendos é outro ponto polêmico da MP. Isso porque a alteração das regras reaviva uma disputa entre o fisco e os contribuintes, que tem origem na diferença entre o lucro fiscal, apurado de acordo com as regras contábeis vigentes até 2007, e o lucro contábil, que segue as regras internacionais para a elaboração de balanços. [...]
Pelo texto da MP, as empresas nessa situação que tivessem feito a distribuição de dividendos excedentes até a edição da norma estariam isentas de qualquer tributação sobre esse valor. E aquelas que ainda não distribuíram, teriam que pagar o imposto quando o fizessem. Houve uma alteração, no relatório, no dispositivo em questão, beneficiando as empresas ao estabelecer que o lucro excedente é isento de tributação desde que tenha sido pago aos acionistas até a publicação da lei.
O relator acabou com a exigência feita pelo Fisco de que as empresas só estariam isentas da tributação sobre os dividendos com a adesão às regras da MP ainda neste ano e não apenas em 2015. Na hipótese dessa mudança proposta pelo relator passar pelo crivo do Congresso, um dos receios dos contribuintes é um possível veto da presidente Dilma Rousseff. [...]
Nova tributação para as multinacionais à parte, na opinião de especialistas é impossível afirmar com exatidão que as novas regras contábeis trarão aumento de impostos de forma generalizada. A economia no pagamento de tributos ou aumento da carga fiscal vai depender de fatores como o tamanho da empresa, o ramo de atividade. [...]
Escrituração digital
A coordenadora de Direito na Fadisp, Faculdade Especializada em Direito, Andreia Antonacci, avalia que, caso haja aumento de carga tributária, essa expansão ocorrerá por vias indiretas. Isso porque o texto força a obrigatoriedade da escrituração digital, uma ferramenta tecnológica que confere aperfeiçoamento da fiscalização. "O governo mais uma vez fecha o cerco à sonegação", resume. O texto também prevê punições para os contribuintes que não prestarem as informações no prazo, enviarem dados incorretos ou omitirem informações do Fisco. A multa pode varia de exatos R$ 500 a 5% sobre o valor omitido, inexato ou incorreto. Na prática, de acordo com Andreia, as novas regras mudarão a forma de se fazer planejamento tributário no País, que deverá ser mais preciso.